De preterido a titular, Valencia espera ficar no Flu: 'Não me dou por vencido'

Disputar posição com o homem de confiança do treinador não é nada fácil. E ele mesmo admite isso. Valencia, porém, foi, lutou e venceu. De preterido a titular no Fluminense, o colombiano está feliz nas Laranjeiras. Prestes a completar 27 anos, Edwin Armando carrega nas costas o sonho de uma família e o peso da palavra vitória (o verbo “win”, em inglês, significa vencer). Mas não se intimida com os obstáculos que a vida o impôs. Na infância humilde no interior de Cali, viu amigos se perderem no mundo das drogas. Em sua cabeça, no entanto, o caminho certo a se seguir tinha apenas uma companheira: a bola. E foi ela que o ajudou a se destacar no esporte em que dois tios já tinham honrado o nome da família. A única coisa que o angustiava era a reserva. Se agora só pensa em renovar o contrato que termina no próximo mês de agosto, em janeiro o jogador quase trocou o calor carioca pelo frio russo.


- A oferta existiu e passou sim pela minha cabeça aceitar. Mas iria sair não pelo dinheiro e sim porque não estava jogando. Só que eu gosto de lutar até o fim. Não me dou por vencido. Queria terminar bem o meu contrato e é isso que estou fazendo. Agora só penso na renovação. Estou feliz demais aqui. Minha esposa ama a cidade e também queria que eu continuasse. Trocar a praia pelo frio? Não dá (risos) - revelou o volante em entrevista ao GLOBOESPORTE.COM.
Adorado por parte da torcida, Valencia cativa com a simplicidade e o sorriso no rosto. Mas se dentro de campo o volante é um leão no combate aos atacantes adversários, fora dele ainda carrega o jeito tímido do forasteiro que sente saudade de seu país natal. Fluente no português apesar da constante insegurança em ser mal interpretado, o jogador não sabe explicar nem mesmo como conquistou a esposa. Ele, aliás, pode se dizer literalmente casado com o Fluminense: a mulher se chama Neyce, que, com o sotaque espanhol do volante, tem uma pronuncia muito parecida como Nense.
- Estamos casados há três anos e juntos há oito. Em breve quero ter filhos. A conheci por intermédio de amigos e começamos a sair juntos. A resenha foi fraca, mas deu certo (risos).
Dá uma moral para ela na entrevista se não depois tem briga em casa... - divertiu-se o jogador.
Deixando a timidez de lado por alguns minutos, Valencia abriu seu coração em frente à praia de Copacabana, bairro que escolheu para morar. Lembrou da infância humilde na Colômbia, evitou falar do pai, com quem aparentemente não mantém contato, festejou seu bom momento nas Laranjeiras, mostrou carinho pelo Atlético-PR apesar da saída conturbada, demonstrou desejo de encerrar a carreira no América de Cali-COL e de voltar a defender a seleção colombiana em breve. E ainda fez uma revelação para a torcida tricolor: era atacante, e goleador, nas categorias de base.

Confira a íntegra da entrevista abaixo:

Seu contrato com o Fluminense termina em agosto. Como está a renovação? Pretende continuar por mais tempo no clube?

As conversas (pela renovação) já começaram. Estou muito bem aqui e gostaria de continuar. Mas vai depender da diretoria. Estou no melhor clube do Brasil, feliz e é isso o que mais me importa. Não passa pela minha cabeça sair.
No início do ano você foi sondado por um clube russo e por pouco a negociação não se concretizou. Chegou a pensar em sair?

A oferta existiu e passou sim pela minha cabeça aceitar. Mas iria sair não pelo dinheiro e sim porque não estava jogando. Só que eu gosto de lutar até o fim. Não me dou por vencido. Queria terminar bem o meu contrato e é isso que estou fazendo. Agora só penso na renovação. Estou feliz demais aqui. Minha esposa ama a cidade e também queria que eu continuasse. Trocar a praia pelo frio? Não dá (risos).
Nas Laranjeiras você teve fases como titular, mas também amargou a reserva em diversos momentos. Agora ganhou novamente a vaga entre os onze e está com moral elevado junto ao técnico Abel Braga. Acredita que chegou o seu momento no Flu?

Espero que sim. Tomara que o momento seja esse. Mas se não for, tenho que respeitar. No clube temos jogadores como Edinho, Diguinho, Jean... Qualquer um pode ser titular. Mas estou feliz por estar jogando bem e espero continuar assim. Vou batalhar sempre para me manter no time.
Chegou a desanimar em algum momento?

Tem de ter humildade e respeito sempre. Se o treinador quiser escalar outro jogador tenho de respeitar. Meu pensamento sempre foi esse. É claro que todos querem entrar em campo. Mas não posso impor nada. Sempre pensei que jogando dez ou cinco minutos eu tinha de aproveitar o máximo. Entrando desde o início era mais dedicação ainda. Todo jogo para mim é uma final. Seja contra o Boca Juniors ou contra qualquer equipe menor do Rio. Ainda mais sendo estrangeiro. Preciso sempre provar o meu valor.
O Edinho é tido como homem de confiança do Abel. É mais difícil disputar posição com um jogador assim?

É difícil e complicado, mas não só com ele. Como falei, são grandes jogadores na posição. Mas o Edinho é um homem de confiança e eles já se conhecem. Só que o Abel é um cara muito justo, muito correto... Sei que quem estiver melhor joga.
Vamos voltar ao passado. Como foi sua infância? Passou dificuldades no início da carreira?

Éramos três irmãos. A infância foi difícil, mas nunca faltou nada. Não gosto de falar do meu pai porque ele não merece. Meu padrasto sempre trabalhou e minha mãe o ajudava de alguma maneira. Eu mesmo com 12 anos ajudava meu padrasto com serviços gerais. Morávamos no interior de Cali, em uma cidade pequena chamada San Antonio de los Caballeros, onde todos se conhecem. A gente não tinha uma grande condição econômica, mas conseguimos ter uma vida boa dentro do possível. Tive amigos, por exemplo, que caíram no caminho das drogas, outros pararam de estudar e eu acabei entrando no futebol.
E o início da sua carreira?

Um ano depois de começar a trabalhar com meu padrasto fui fazer um teste no América de Cali. Inicialmente eram 150 jogadores e no fim ficaram apenas cinco que construíram a carreira no clube. Eu mesmo continuei lá e fiz toda a minha base. Foi um sentimento de vitória. Era muita gente e o tempo de teste era curto. Consegui me destacar e permaneci por 13 anos no América.
Jogar bola era um sonho de infância?

Era sim. Na minha família dois tios tinham conseguido iniciar uma carreira nos gramados. Um deles, Manuel Valencia, era zagueiro do Deportivo Cali e chegou na final da Libertadores de 1999. Acabou perdendo para o Palmeiras, mas era uma grande referência.
Em campo você é um verdadeiro cão de guarda. Sempre jogou como volante?

Não. Acabei virando volante por circunstâncias. Durante a base jogava como atacante. E fazia muitos gols, pode acreditar (risos)! Atuava aberto pelas pontas como o Araújo e o Wellington Nem. Mas um dia disputando um torneio pela seleção de base de Cali, os volantes acabaram se machucando. Era o capitão e recuei para ajudar. Fui muito bem e o treinador nunca mais me colocou na frente. Aí quando voltei para o América, o treinador decidiu poupar os titulares que disputavam a Libertadores e chamou alguns atletas da base para disputar o campeonato colombiano. Fui escalado no meio em meu primeiro jogo como profissional. Acabei marcando um gol, mas nunca mais voltei a ser atacante.
Sua carreira foi construída no América. Como foi receber uma proposta para atuar no Atlético-PR e no futebol brasileiro?

Aqui se joga o melhor futebol do mundo. Era um grande sonho. Eles haviam tentado a minha contratação em 2004, mas o América acabou pedindo muito dinheiro. Depois ficaram sabendo de problemas de pagamento no clube e me ajudaram conseguindo a contratação. Foi um sonho.
Você mostra carinho pelo Atlético-PR e foi querido por lá. Mas sua saída foi conturbada. Chegou a surgir a informação de que o clube rasgou sua carteira de trabalho para dificultar o acerto com o Fluminense. Como foi essa época?

Foi difícil. Não tenho certeza, mas acho que destruíram sim a minha carteira. O Atlético falava que iria liberar, mas quando aconteceu a negociação eles quiseram desistir. E aí eu falei que iria vir, que era a minha vontade. Quando cheguei no Rio surgiu todo esse problema e eu tive de fazer uma nova carteira de trabalho. Lembro até que sugeri ao meu empresário que se eles não aceitassem me liberar eu voltaria e ficaria treinando separadamente até o fim do meu contrato. Faltavam poucos meses. Seria ruim para mim, mas se fosse necessário eu faria.
Seu início no Fluminense foi complicado já que você passou um tempo sem poder entrar em campo...

É verdade. E jogador quer sempre estar em campo. Mas eu me mantive a tranquilidade. Vim com indicação do Muricy Ramalho, que era o técnico na época, e sabia que teria a minha chance.
A torcida tricolor criou uma identificação com você. Até mesmo apelidos foram criados. Há quem te chame de Pelência...

Comparação com Pelé? Pelência? Aí também não dá, né (risos)? Mas fico feliz com o carinho. No Atlético já tinha acontecido isso, mas agora está cada vez melhor. Fico feliz demais. Saio pouco de casa, mas quando vou a um restaurante o pessoal já me reconhece.
Voltar a ser convocado para a Seleção da Colômbia ainda é um objetivo?

Gostaria muito. É o meu país. Estou trabalhando muito para isso. Espero ter oportunidade com o novo treinador. Não estou ansioso, não posso ficar criando expectativa. Tenho de trabalhar e esperar. Mas seria maravilhoso. Fui campeão Sul-Americano sub-20, tive algumas chances em amistosos, mas desde que vim para o futebol brasileiro não tive mais chances.
Jogar na Europa é um desejo ainda?

No Atlético tive a chance de ir para a França. Mas acabou não se concretizando. Agora estou no Brasil. Não tem por que sair. Penso em continuar e lá na frente encerrar a carreira no América de Cali. Tomara que eles voltem logo para a Primeira Divisão.
No Fluminense você já viveu tudo: de títulos ao dissabor de uma eliminação precoce na Libertadores. Só faltou um gol. Você foi atacante na base. Não sente falta?

Não sinto porque quase não faço. Desde que vim para o futebol brasileiro marquei apenas uma vez. E nem me lembro quando foi (risos)! Vamos ver se sai. Eu até tento arriscar um chute ou outro, mas a bola não entra.
Contra o Bonsucesso você recebeu uma bola na cara do gol, mas tocou para o Fred. Não era para ter chutado?

O Deco até me xingou depois do lance (risos). Mas na hora eu resolvi tocar para quem sabe e ele acabou perdendo. Vamos ver. Uma hora entra (risos).
A grande maioria dos jogadores de futebol escolhe a Barra como refúgio. Mas você optou por uma improvável Copacabana. Por quê?

Aqui fico mais perto do trabalho. Sempre escutava que morar na Barra é complicado porque demora muito para chegar nas Laranjeiras e, por isso, é preciso acordar muito cedo. Saindo de Copacabana, chego em 20 minutos. Com trânsito levo meia hora no máximo.
Mas você já sabia que Copacabana e sua praia estão entre os pontos turísticos mais famosos da cidade?

Já tinha escutado sim, mas não foi por isso que escolhi. Quando vinha jogar com o Atlético-PR no Rio a gente se hospedava em Copacabana. Moro de frente para a praia. É uma vista linda, mas fico só olhando mesmo.
Não vai dar nem um mergulho?

Não. Me falta tempo livre. Prefiro curtir a vista. Fora que se eu for pegar sol na praia vou ficar ainda mais negro (risos).

E quando sai na rua como é o reconhecimento?

As pessoas me reconhecem como jogador do Fluminense e é legal. Mas uma coisa que deu para ver aqui em Copacabana é que existem muitos estrangeiros. Aliás, aqui moram muitos colombianos.
E você se relaciona com eles?

Sim. Existe uma comunidade grande aqui. Inclusive minha esposa viu no Facebook uma comunidade chamada Colombianos no Rio. São muitos estudantes, outros formados, alguns médicos... E a grande maioria mora na Barata Ribeiro, que é uma rua perto da minha. Então a gente conheceu vários e de vez em quando nos encontramos.


Fonte: Globo Esporte

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