Cavalieri avalia 2015 como melhor ano após 2012: "Consegui corresponder"


Discreto, Diego Cavalieri não é muito afeito a falar de si. Principalmente para se vangloriar de algum feito, alguma defesa. Às vezes, ele abre algumas raras exceções. Sentado à beira da piscina do condomínio onde mora, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, o goleiro recebeu o GloboEsporte.com fez uma avaliação sobre seu quinto ano defendendo o gol do Fluminense. Para ele, foi a temporada em que mais se aproximou do desempenho fantástico que teve em 2012, quando foi um dos principais responsáveis pelo título brasileiro.



E 2015 foi de muito trabalho para Cavalieri, o terceiro colocado no ranking de número de defesas difíceis no Brasileiro (confira acima no vídeo a eleição do goleiro das cinco principais). Como já é de costume, ele teve mais um ano de grande regularidade e só desfalcou a equipe em duas rodadas da competição. Fez jus ao apelido "Mutante" dado pelo preparador André Carvalho. 

- Depois daquele ano eu sabia que a cobrança seria diferente. Mas acho que 2015 foi o ano em que eu mais me aproximei de 2012 em termos de defesas difíceis e regularidade. Consegui corresponder. Naquele Brasileiro também fiz muitas defesas difíceis, mas quando se ganha o contexto é diferente. O resultado negativo apaga um pouco - afirmou.

Diego Cavalieri também fez projeções para o futuro. Com os pés no chão. Para ele, a realidade é que o Flu não tem um elenco tão forte quanto os principais do Brasil. Por isso, precisa manter a base e se reforçar para sonhar com voos mais altos em 2016. 

- Se paramos para ver, tem outros elencos com mais força do que o nosso, mas esse ano mostrou que está tudo muito nivelado. Prometer título é difícil, mas com certeza temos condição de fazer um belo ano. Sabemos que é normal ter mudanças nesta época, mas se boa parte da base que formamos for mantida, além da comissão técnica, acho que temos boas possibilidades de fazer de 2016 melhor do que 2015. O trabalho do Eduardo é fantástico, é um cara bastante estudioso e que nos cobra muito no dia a dia.

Confira a entrevista com o camisa 12 tricolor:

GloboEsporte.com: Que balanço você faz desta temporada? Dá para tirar aspectos positivos, apesar da falta de título?

Diego Cavalieri: Foi um ano que começou bastante conturbado, cheio de questionamentos por tudo que envolveu a saída do patrocinador e de jogadores importantes. Foi uma mudança grande no elenco. A previsão era de muita dificuldade. Sabíamos que teríamos que trabalhar muito para inverter esse quadro. Acho que até conseguimos isso. Tivemos um bom início de Brasileiro, mas depois acabamos nos perdendo, tivemos uma grande sequência de derrotas. Acabou ficando uma mancha. Mas na Copa do Brasil chegamos na semifinal e perdemos nos pênaltis. Tirando o declínio no Brasileiro no segundo turno, acho até que foi um ano de superação. Claro que poderíamos estar em uma situação melhor na tabela. De bom também tivemos os jovens jogadores que tiveram chance e se firmaram. O clube também conseguiu vender atletas importantes, como o Kenedy e Gerson.

Faltou maturidade ao time para evitar tantas oscilações?

Até pela idade do time, isso é uma coisa normal. O elenco foi reformulado e entraram muitos jogadores jovens, jogadores que tiveram a primeira chance em um time grande. Isso tem um peso. A cobrança no Fluminense requer um tempo para se adaptar e entender o processo. Dentro de campo é natural cometer equívocos, que com o tempo vão diminuir. Cabe a nós mais velhos, como foi feito este ano, conversar e orientar bastante. Todos passam por isso. O jovem é mais ansioso, quer fazer as coisas rápido. O dia a dia vai dando experiência e moldando.

E individualmente, qual avaliação faz do seu ano?

Sempre somos bastante cobrados. A responsabilidade é grande, mas acho que foi um ano bastante regular para mim. Fui bastante exigido e acho que consegui corresponder bem. Foi bastante produtivo. O goleiro é sempre analisado individualmente, e acho que foi um ano muito bom por causa desta regularidade durante toda temporada.

E em uma comparação com a fantástica temporada de 2012, como você classifica seu desempenho em 2015? Foi perto?

Para falar a verdade, quando acabou 2012 a primeira coisa que falei com meu irmão foi que tinha sido um ano ruim para mim (risos). Aí ele não entendeu: "Mas como ruim?". Aí eu disse que dali para frente a comparação seria naquela base. Foi um ano atípico. O time encaixou, não perdia. Até levava sufoco nos jogos, mas era muito consciente. Vários vezes levamos pressão e conseguimos suportar. Tudo aconteceu bem. Mas depois daquele ano sabia que a cobrança seria diferente. Mas após 2012 acho que 2015 foi o ano que eu mais me aproximei em termos de defesas difíceis e regularidade.

Fora de campo esta temporada foi mais tranquila do que no ano passado, quando viveu momentos conturbados na negociação para renovar o contrato e também com a ausência na Copa do Mundo em cima da hora?

Sou muito concentrado. Na vida temos vários problemas, e não podemos deixar que influenciem. Ainda mais na posição que eu jogo, que é muito delicada e exige estar muito bem tecnicamente, fisicamente e mentalmente. Se deixar interferir, vai prejudicar dentro de campo. Claro que a ida para a Copa era um sonho, um objetivo... se falasse que não fiquei chateado estaria mentindo. Óbvio que fiquei chateado, cheguei bem próximo. Mas os goleiros que foram estavam em altíssimo nível e a convocação foi justa também. Foram dois dias que fiquei muito triste, mas coloquei na cabeça que tinha que esquecer e deixar passar. Foi o que aconteceu.

Nas estatísticas do Brasileiro, você está em terceiro no ranking de defesas difíceis (58), atrás apenas do Marcelo Lomba (70) e do Danilo Fernandes (65). Em 2014, você ficou em oitavo com 46. Existe uma explicação para isso? A bola chegou mais no gol do Flu?

Naquele Brasileiro também fiz muitas defesas difíceis, mas quando se ganha o contexto é diferente. O resultado negativo apaga um pouco. Mas como eu disse, 2015 foi um ano bastante conturbado. Se falou muito dos homens de defesa, mas é um sistema que tem que funcionar. Houve um momento em que estávamos equilibrados, conseguimos regularidade, mas depois acabou não acontecendo. Os homens de meio de campo e do ataque também têm responsabilidade. Senão sobrecarrega. Mas o número de defesa difíceis é realmente muito alto. Independentemente da situação, se é boa ou ruim, o importante é manter a concentração, porque a cobrança é muito grande. Se tiver perdendo, não pode chutar o balde. É em cima disso que trabalho.

Esse foi o Campeonato Brasileiro dos goleiros?

Sem dúvida. Tinha muito tempo que não via um campeonato tão equilibrado com todos os goleiros em alto nível, fazendo boas exibições. Mostra o trabalho que vem sendo feito. Tive a oportunidade de jogar fora dois anos (no Liverpool), e tecnicamente o que se treina aqui é totalmente diferente. Aqui é mais intenso, mais específico, com muitas repetições de situações de jogo. Lá, lembro que eram 15 ou 20 minutos de aquecimento e depois já íamos para junto dos outros jogadores. Aqui no Brasil é diferente. O importante é isso, sempre se aperfeiçoar e minimizar a margem de erros.

Foi mais um ano em que você teve também uma boa regularidade de presenças. No Brasileiro foram apenas duas rodadas do Brasileiro fora...

O jogo contra o Figueirense fiquei fora por causa de suspensão automática, o que foi uma situação atípica para mim. Foi em um momento em que eu já estava com um problema lombar que estava me incomodando. Contra o Internacional, acabou agravando, aí fiquei fora dos jogos contra o Paysandu pela Copa do Brasil. Mas foi uma recuperação rápida e felizmente depois não tive mais problema. Me dedico porque é o que eu amo fazer e sei o quanto foi difícil de chegar até aqui. Gosto não só de jogar, mas de treinar também. Às vezes até o pessoal briga, pede para segurar quando estou com alguma dor. Mas sempre brigo para estar dentro de campo. Se cuidar é muito importante, porque hoje em dia é tudo muito intenso.

Goleiro convive mais com dores do que os jogadores de linha? Você já jogou muito pelo Fluminense sem estar em condições ideais?

Se perguntar para qualquer atleta, dificilmente alguém vai falar que está 100%. Você aprende a conviver com a dor. Claro que uma dor que não te limite, dentro de uma responsabilidade. Não pode por vaidade ir para dentro de campo e forçar uma situação e prejudicar o trabalho de todo um grupo. Quando não dá, tem que chegar e falar que não dá.

No Fluminense você tem fama de suportar essas dores acima da média dos demais atletas... Por isso o apelido "Mutante" (dado pelo preparador de goleiros André Carvalho)?

(Risos) Não sei. Chamam, né. Mais é porque eu amo o que faço, desde moleque. Gosto muito de treinar e jogar. Não tem tempo ruim. Se tiver que fazer físico, eu faço. Se tiver que cair, eu caio. Se tiver que pular, eu pulo. Mas acho que (o apelido) foi por coisas que foram ocorrendo. Falavam: "Agora ele para". Aí eu via que dava para ir e ia. Teve a época em que o Fluminense estava naquela briga para não cair, em 2013, e eu cortei o dedo em uma mesa de vidro dentro de casa. Levei sete pontos no dedo. Faltam duas rodadas. Foi um momento em que tiveram certeza de que eu não jogaria, mas fiz todo esforço, sem colocar em risco minha condição de jogo. É preciso ter superação, dentro de um limite. Mas acho que essas situações que acabaram me dando este apelido.

Comparando com este ano, o Fluminense entra na pré-temporada de 2016 melhor, com uma perspectiva mais otimista?

Ano passado as mudanças foram muito bruscas, muitas jogadores vitoriosos e experientes deixaram o clube. Isso foi difícil. Muitos chegaram para a primeira experiência em um time grande. Sabemos que é normal ter mudanças nesta época, mas se boa parte da base que formamos for mantida, além da comissão técnica, acho que temos boas possibilidades de fazer de 2016 melhor do que 2015. O trabalho do Eduardo é fantástico, é um cara bastante estudioso e que nos cobra muito no dia a dia.

Este ano o Flu chegou até a semifinal da Copa do Brasil. Pode ter sido a maturação para algo maior na próxima temporada?

Não dá pra dizer brigar por títulos. Se paramos para ver, tem outros elencos com mais força do que o nosso, mas esse ano mostrou que está tudo muito nivelado. Briga intensa por Libertadores, contra o rebaixamento... Só o Corinthians que encaixou e teve uma folga. Todos os outros oscilaram. Isso mostra que tem que ter mais regularidade e maturidade, saber que cada jogo é importante. Prometer título é difícil, mas com certeza temos condição de fazer um belo ano.

Se você mantiver uma boa regularidade acredita que ainda pode encontrar uma brecha na seleção brasileira?

Sou um cara bem realista. É um objetivo, um sonho, quero muito, mas a Seleção está muito bem servida.Foi um ano que todos os goleiros foram muito bem. Hoje temos o Alisson como titular. É uma revelação que surgiu muito bem e que é muito maduro pela pouca idade que tem. O Jefferson considero um dos mais completos. Tem ainda o Marcelo Grohe, o Cássio, Victor, Fábio... enfim. São vários. O importante é fazer bem seu trabalho e deixar as coisas acontecerem de forma natural. Se o momento acontecer, estar bem para agarrar a oportunidade.

Fonte: Ge
Texto e Foto: Fred Huber